Diário Liberdade – O décimo aniversário de NÓS-UP chega sem que a unidade da esquerda independentista galega tenha sido ainda possível. Falamos com o Porta-voz Nacional desta organizaçom sobre esses dez anos e sobre o momento político atual. Aos seus 28 anos, Alberte Moço, trabalhador viguês assalariado no setor das artes gráficas, tem umha longa trajetória de militáncia no seio da esquerda independentista galega, incluindo a condiçom de militante de NÓS-Unidade Popular desde a Assembleia Nacional Constituinte, em 2001. Se bem a entrevista estava programada há dous meses com motivo do décimo aniversário dessa organizaçom, só agora pudemos concretizar este trabalho. Além da crise capitalista e as recentes eleiçons municipais, o momento atual traz novos pontos de interesse, dada a iminência de um Dia da Pátria em que NÓS-UP recupera, após o abandono de Causa Galiza, umha convocatória própria que nom realizava desde 2005. Diário Liberdade – No passado dia 5 de Junho, NÓS-UP comemorou os seus 10 anos de vida. Que mudou no panorama independentista galego entre 2001 e 2011? Alberte Moço – Se compararmos a foto fixa de aquele momento e a de hoje, as mudanças tornam-se incontestáveis. Os centros sociais, as candidaturas populares, os núcleos independentistas no sindicalismo, a ruptura com o regionalismo, o renascer das reivindicaçons nacionais no desporto e na cultura, entre outros muitos exemplos que poderíamos citar, som realidades novas ou que se vírom submetidas a profundas mudanças durante a última década. Se também observarmos o caminho que seguimos para atingir este ponto, torna-se evidente que os últimos dez anos fôrom tempos de constante movimento que nos levárom a um status quo radicalmente diferente. É claro que entre 2001 e 2011 vamos encontrar muitos elementos comuns ‑somos fruto dumha história‑, mas podemos afirmar que hoje o nosso movimento é mais maduro, mais rico e tem mais possibilidades de sucesso do que há dez anos. DL – Qual o balanço da vossa intervençom política depois de umha década? Alberte Moço – Como em qualquer processo dialético, na breve história da Unidade Popular tem havido momentos de avanço e momentos de retrocesso. Nom vamos ocultar que nascemos com o intuito de reagrupar umha esquerda independentista dispersa e essa tarefa continua pendente. Nom vamos ocultar que pretendemos dar um salto qualitativo na nossa capacidade mobilizadora e continuamos acumulando pequenos passos quantitativos. Mas, apesar disto, o nosso balanço nom pode deixar de ser positivo, apesar do anterior sim conseguimos construir umha organizaçom eficaz na hora de cumprir a sua funçom: mobilizar a fraçom mais consciente do povo galego em torno de um programa socialista, independentista e feminista. Fruto disto é umha dilatada trajetória de trabalho comarcal, de mobilizaçom, de campanhas de longo alcance que constituem um património inigualável e que nos proporcionam umha implantaçom social qualitativamente superior àquela que a esquerda independentista tinha antes de 2001. Além disso, devemos entender o papel de NÓS-UP inserido numha totalidade superior, a dum movimento organizado em rede, que atinge um espectro social e um espaço geográfico muito amplo. Som todos estes factores que nos levam à satisfaçom, umha satisfaçom crítica, naturalmente, como é próprio de qualquer movimento revolucionário. DL – Que opiniom tendes dos resultados registados nas recentes eleiçons municipais e, concretamente, dos votos obtidos polas candidaturas soberanistas? Alberte Moço – Podemos fazer duas reflexons fundamentais. Em primeiro lugar, contrastamos a grande dificuldade que existe para as opçons rupturistas concorrerem no terreno eleitoral: bons programas, certa implantaçom social e campanhas bem realizadas traduzem-se em resultados que nada tenhem a ver com os dos grandes partidos que gerem milhons de euros e aparecem a diário nos meios de comunicaçom de massas. Mas, por outro lado, quase todas as candidaturas apresentadas ultrapassam o patamar de 1%, recordemos que 5% dos sufrágios implica a obtençom dumha ata em boa parte dos concelhos. Em definitivo, podemos concluir que o eleitoral é um campo de trabalho difícil, mas que permite um trabalho direto sobre as problemáticas municipais e que a esquerda soberanista tem sentado as bases para que, no médio prazo, comece a proliferar a representaçom do nosso projeto nas instituiçons. DL – A que se deveu a contundente vitória da direita num contexto de profunda crise como o que vivemos? Alberte Moço – Pois sem dúvida à ausência de alternativas revolucionárias com projeçom de massas e à constataçom evidente de que o resto de forças do sistema nom suponhem alternativa algumha, tal e como teimam em demonstrar a diário. Sem agentes políticos amplos e consolidados na esquerda que podam levar às ruas um discurso transformador, o nosso povo nom vai ter mais escolha que a que é oferecida pola maquinaria mediática da burguesia, isto é: PP ou PSOE. As desastrosas consequências da crise fôrom absurdamente atribuídas à gestom do Estado e, correspondendo esta ao PSOE, o povo trabalhador nom pode ver além da falsa opçom «menos má» do Partido Popular. É por isso que os movimentos revolucionários nom podemos deixar de acumular forças para introduzir na sociedade um discurso que rompa esta perversa dinámica e demonstre a existência de alternativas reais à alternáncia bipartidarista. DL – Todo indica que venhem anos de ofensiva direitista após a vitória do PP, que se poderá alargar depois das eleiçons espanholas do ano próximo. Como pode o movimento popular galego enfrentar essa ofensiva? Alberte Moço – Venhem anos de ofensiva direitista, provavelmente, mas nom levamos já anos inseridos nessa ofensiva? Nom vamos negar que o caráter abertamente neofascista do Partido Popular se permite aplicar certas medidas sem necessidade de muitas justificaçons, nem vamos obviar que esta organizaçom tem um estilo de governo autoritário e repressivo que nom é o mesmo que o do PSOE. Mas nom por isso vamos cair na armadilha de traçarmos diferenças de fundo entre umha e outra gestom. Efetivamente, venhem anos duros para as classes populares, mas nom devido a qualquer mudança no governo, e sim às necessidades imediatas da burguesia espanhola de sair da crise descarregando os seus efeitos sobre as trabalhadoras e trabalhadores. O movimento popular galego, nesta conjuntura, tem umha oportunidade histórica de canalizar o descontentamento geral face a saídas transformadoras ou pode sucumbir ao ataque. Os momentos de crise social nom fam mais do que abrir infinidade de novos caminhos e vai depender da nossa maturidade política seguirmos um ou outro. DL – Porque NÓS-UP deixou de participar na vida interna e nas convocatórias de Causa Galiza? Deixastes de apostar na unidade independentista? Alberte Moço – Nem muito menos, a unidade do movimento de libertaçom nacional e social continua a ser um dos nossos objetivos estratégicos. O que acontece é que nom podemos converter esta unidade num fetiche e esquecer que nesta altura, dada a atual conjuntura no seio do campo soberanista, a unidade orgánica continua a estar bastante longe. Causa Galiza fracassou como tentativa unitária e nós, como impulsionadores desta iniciativa, assumimos a nossa parte de responsabilidade. Para quem quiger conhecer mais a fundo o nosso parecer sobre esta questom concreta, recomendo a leitura do artigo publicado pola companheira Patrícia Soares e polo companheiro Bruno Lopes recentemente. Em qualquer caso, continuamos a apostar em verdadeiras dinámicas unitárias, sempre que sejam respeitosas com a pluralidade do nosso movimento, sempre que assumam o caráter de esquerda da nossa luita e sempre que partam da completa autonomia face ao regionalismo. DL – Existem só diferenças pessoais e atitudes sectárias ou também programas diferentes que impossibilitam a unidade? Alberte Moço – Existem orientaçons políticas diferentes, sem dúvida. Isto é o normal e mesmo o saudável, num movimento que pretende mudanças radicais da sociedade. Qualquer companheira ou companheiro que tenha observado de perto as dinámicas conjuntas dos últimos anos, terá assistido a polémicas de raiz política ou ideológica de todo o tipo. Se calhar, a ninguém pudo escapar a referida ao caráter de esquerda do nosso movimento, à orientaçom linguístico-cultural, aos modelos organizativos e outras que fôrom tornando evidente a existência de roteiros distintos no caminho que deve conduzir à nossa emancipaçom. Esclarecido isto, a nossa opiniom é que há alguns destes debates nos quais nom podemos fazer demasiadas concessons e devemos manter a constante batalha ideológica, pois hipotecaríamos o futuro do nosso movimento, e outros podem ser adiados enquanto mantemos posiçons de consenso. O problema das diferenças pessoais e as atitudes nom fai mais do que modular esta dialética de fundo, que é a que realmente conta e a responsável pola situaçom em que nos encontramos em cada momento. DL – No próximo Dia da Pátria, NÓS-UP convoca umha manifestaçom própria, diferentemente do que tem acontecido nos últimos anos. Que motivou esta decisom? Alberte Moço – Estas questons que acabamos de analisar explicam parcialmente a nossa escolha. Além disso, da Unidade Popular achamos que hoje é necessário recuperar as palavras de ordem da independência nacional, do socialismo e do feminismo que dam sentido ao nosso movimento. É por isso que decidimos convocar umha manifestaçom cuja principal peculiaridade nom é que leve o carimbo de NÓS-UP, e sim o facto de ser umha manifestaçom independentista. Haverá, além da nossa, umha manifestaçom pola “soberania nacional” e mais umha do reformismo autonomista que, como sabedes, leva a mesma palavra de ordem da “soberania”. Parece-nos completamente legítimo que estes projetos se mobilizem, mas a nossa base social exige outra cousa e a organizaçom concorda plenamente com este sentir. DL – Qual é o campo de trabalho prioritário para a vossa organizaçom e para a vossa corrente política no futuro imediato? Alberte Moço – Como indicava antes, o nosso projeto acha-se numha etapa de acumulaçom de forças, tentando constituir as ferramentas necessárias para mobilizar o povo trabalhador lá onde Espanha e os patrons apresentarem batalha. Hoje nom vemos melhor forma de fazer isto que a partir dos centros de trabalho, onde a ofensiva burguesa está a desmascarar a natureza brutal e predadora do Capitalismo e onde som muitos os olhos que se estám a abrir e os ouvidos que começam a prestar atençom a discursos que apostam em destruir esta sociedade e construir umha nova sobre as suas cinzas. Porém, a Unidade Popular nom pode deixar de parte a reivindicaçom da nossa independência nacional e neste momento achamos que é necessário revitalizar este aspeto do nosso programa. O regionalismo tem degenerado ao ponto de nom representar nada semelhante a um projeto nacional e no nosso movimento estamos dispostas a preencher esse espaço. DL – Sabemos que é mais necessário que nunca, mas… É possível converter a esquerda independentista galega num movimento com dimensons e influência de massas? Alberte Moço – É. Claro que é. Nom só possível, mas imprescindível. Teremos que superar muitos obstáculos, teremos muito que aprender, teremos que deitar sangue, suor e lágrimas, mas isto é o que levamos fazendo os últimos dez anos. Seguimos adiante com o nosso projeto, porque confiamos no nosso futuro e porque sabemos que a dialética da história avança devagar, passinho a passinho até que chega o momento crítico e a realidade muda da noite para o dia. Levamos muito avançado no caminho que indicades e temos pensado seguir na mesma, achamos que contamos com um projeto sólido e temos vontade de ferro, portanto só nos resta seguir a trabalhar. DL – Umhas palavras finais para os leitores e leitoras do Diário Liberdade? Alberte Moço – Apenas quero agradecer ao Diário Liberdade a oportunidade de compartir estas reflexons com as vossas leitoras e leitores. E naturalmente parabenizo-vos pola qualidade e polo sucesso que estades a atingir. Vemo-nos no próximo dia 25 na Alameda de Compostela para levar às ruas todo isto que agora fica dito. |