Foi a quarta greve geral em que participei. De todas elas, esta foi, sem dúvida, a que teve mais adesão. Mas também foi a que teve mais violência. Perante a resposta massiva dos trabalhadores, a burguesia usou o Estado para intimidar e reprimir. Usou os jornais, rádios e televisões para difamar a greve geral. No grave contexto em que vivemos, o combate que, ontem, se travou deve ser visto como uma faísca que incendeia.
Não se pode dizer, contudo, que esta resposta foi à altura da ofensiva capitalista. Foi à medida das possibilidades e não das capacidades da classe trabalhadora. Isto é o início e não o fim. O capital abriu uma nova fase na luta de classes e cabe-nos ganhar, passo a passo, a força necessária para derrotar a vaga neoliberal e desmascarar a social-democracia. Daí que quem pensar que invadir as escadarias ou a própria Assembleia da República é a solução não percebe nada de táctica ou de estratégia. Pior: não compreendem que não é ali que reside o poder.
Desviar a atenção do essencial e incidir sobre o assessório é grave. Em primeiro lugar porque a resposta grevista e a repressão policial foram desvalorizadas do ponto de vista mediático. Em segundo lugar porque a verdadeira confrontação de classes se dá onde se dá a exploração. Em terceiro lugar porque embora a tomada do poder seja uma questão sempre actual ela não está, para já, ao nosso alcance. Ontem, o que se viu menos nas televisões foi a combatividade dos trabalhadores organizados à porta das suas empresas. A coragem de quem enfrenta o patrão, com todos os riscos que isso comporta, ficou em segundo plano.
Houve quem quase fosse atropelado nos Olivais por um camião do lixo conduzido por um fura-greve. Em Paço de Arcos, a polícia impediu a intervenção dos piquetes com o recurso a armas de fogo. Sete carrinhas da polícia de choque foram mobilizadas para a Musgueira onde cerca de uma centena fazia resistência no chão em frente à Carris. Também ali estava o deputado comunista Miguel Tiago e também ele foi arrancado à muralha humana pela força. Uma realidade que nega as consignas de quem, ontem, depois de tentar invadir as escadarias do parlamento gritava contra todos os políticos.
De norte a sul do país, houve uma imensa muralha humana que urge aumentar e reforçar. Os próximos meses serão decisivos e há que desenvolver acções de luta mais e menos gerais. Temos um caminho a percorrer e obstáculos a ultrapassar. Não interessa tentar chegar sós ao destino quando só o podemos alcançar juntos. Há que intensificar a luta para que um dia esta muralha se transforme em rio e possa tomar o céu de assalto.